sábado, 3 de abril de 2021

Que influência tem a Universidade dos Açores?


Inovação académica não muito útil...

(Publicado no Diário Insular de 02 de Abril de2021)


A Universidade dos Açores poderá ter falhado na sua missão de apoiar o desenvolvimento dos Açores, quando comparada com outras instituições nacionais. Um exemplo é a utilização de erva na alimentação do gado, uma aposta da investigação universitária açoriana que não vingou. A lavoura está hoje afogada com concentrados que só degredam os resultados económicos das explorações.


    

 Um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian mostra que na Região Centro de Portugal as três universidades e os vários institutos tecnológicos e instituições de investigação existentes têm uma grande ligação às empresas, fazendo deste território um importante espaço de inovação, com a aplicação e utilização desse conhecimento nos processos de desenvolvimento económico.

O estudo explica como a ligação entre o mundo empresarial e as várias instituições de ensino têm contribuído para transformação da Região Centro do país, com bons resultados económicos e com efeitos visíveis no desemprego.
Perante os dados expostos, é pertinente perguntar se a Universidade dos Açores terá dado um contributo semelhante ao desenvolvimento e inovação nas ilhas.

RETRATO DA REGIÃO CENTRO

O estudo da Fundação Calouste Gulbenkian, refere a 2017, aplicado à Região Centro, mostra - entre muitos aspetos - a ligação entre o mundo empresarial e as várias instituições de ensino, entre os quais a Universidade de Coimbra, a Universidade de Aveiro e a Universidade da Beira Interior - três universidades públicas - e vários institutos, designadamente o Instituto Politécnico de Coimbra, a Escola Superior de Enfermagem, o Instituto Técnico de Castelo Branco, o Instituto Técnico de Leiria, o Instituto Politécnico da Guarda e o Instituto Politécnico de Viseu.
Nesse estudo aborda-se, entre outros aspetos, a ligação entre o ensino superior, a investigação e os ecossistemas de inovação.
            Verifica-se que é um importante contributo que a Região Centro dá ao País em termos de formação superior, incidindo particularmente na área das ciências exatas e naturais, tais como engenharias, áreas de formação particularmente relevantes para a modernização do tecido produtivo da Região e do País.
O conjunto das três universidades públicas, agregando os principais Institutos, Centros e Laboratórios de Investigação, desenvolveu competências que constituem uma importante componente para o desenvolvimento da Região. Com frequência se veem notícias de trabalhos de investigação desses estabelecimentos de ensino reconhecidos no estrangeiro bem como produtos inovadores desenvolvidos, em particular nas áreas da tecnologia e da informática, de igual modo, com interesse por outros países.

De acordo com o estudo da Gulbenkian, a Região Centro conta com um conjunto de infraestruturas de apoio e desenvolvimento tecnológico que desenvolve um papel fundamental de suporte e promoção da competitividade das áreas produtivas a que respeitam. Para além dos centros ligados às universidades, destaca-se um conjunto de centros de apoio e desenvolvimento tecnológico em domínios vários (cerâmica e vidro, moldes e ferramentas especiais, têxteis e vestuário, telecomunicações, biomassa para a energia, computação gráfica, entre outras). De entre as entidades desta natureza ligadas à universidade destaca-se, pela sua natureza e expressão, o Instituto Pedro Nunes.

Para a realização do estudo em causa foi feita uma análise da rede de 344 projetos, com o envolvimento de um total de 594 organizações (58% do total das organizações do todo nacional - ver quadro).
Segundo o INE, a Região Centro regista a taxa de desemprego mais baixa do país, um fenómeno que se verifica há vários anos e que pode, de igual modo, ser atribuído a essa forte relação das universidades e centros de investigação, às empresas da Região.




Que influência terá tido
a Universidade dos Açores?

Existem áreas onde é clara a importância do ensino superior na expansão do conhecimento no arquipélago. Por exemplo, nas ciências da educação, nas ciências do mar e em vários setores ligados à zoologia e à botânica.
Mas há quem considere que a universidade açoriana não teve o papel que poderia ter na área da agricultura, em particular na agropecuária, principal suporte do setor primário e da riqueza das ilhas.
As especiais condições edafoclimáticas das ilhas - repetidamente evocadas por políticos e representantes da lavoura - para produção de leite e carne à base de erva talvez não tenham sido tão aproveitadas como se esperava.
A Universidade chegou a fazer estudos sobre as ervas com maior rendimento e que melhor serviriam essa produção, face às novas exigências dos mercados verdes e de natureza, mas muitos lavradores acabaram por recorrer às rações, levados pela tentação de uma maior produção.

Hoje, verifica-se, pelas contas da RITA (Rede de Informação e Contabilidade Agrícola), que muitos lavradores estão a utilizar concentrados em quantidades que não são economicamente rentáveis, porventura alguns estarão mesmo a ter prejuízo e essa prática estará a criar maiores dificuldades ao setor já a braços com os preços de mercado, em função da concorrência e da enorme produção de alguns países, inclusive da União Europeia.

A escolha do Prof. José Matos para presidir ao conselho científico para inovação agroalimentar - opção muito adequada e bastante elogiada - pode ajudar a incentivar algumas mudanças. O Professor José Matos foi, de resto, um dos académicos que, desde há muito, se bateram por alterações no setor, em declarações públicas e em conferências.
É hoje indiscutível que o papel das Universidades é um elemento essencial como polo de dinamização da economia, através da investigação, do melhoramento dos produtos e da criação de novas ideias.
A Região Centro é um bom exemplo, de acordo com o estudo da Fundação Calouste Gulbenkian. Será que a Universidade dos Açores foi importante para a dinamização da Região ou terá faltado imaginação ou - porventura - vontade política em colocar novas ideias no terreno, designadamente nas áreas chave como a produção de leite e carne?

Rafael Cota

 

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